terça-feira, 17 de julho de 2007

I JORNADA DE CRIMINOLOGIA E JUSTIÇA PENAL

I JORNADA DE CRIMINOLOGIA E JUSTIÇA PENAL



Organização: FEMA “Fundação Educacional do Município de Assis” ESA- Escola Superior de Advogacia- Núcleo Assis 20 de outubro de 2007. Sábado Local: Cinema Municipal de Assis

Palestrantes:

Dra. Elídia Aparecida de Andrade Corrêa - Juíza Federal
Dr. Adugar Quirino do Nascimento Souza Júnior - Juiz Estadual SP
Dra. Maria Regina Ramos - Psquiatra Forense MP/SP
Dr. Ari Friedenbach - Advogado, pai de Liana assassinada pelo "Champinha"
Dr. Márcio Zuba Oliva - Advogado Criminalista
Dr. Rafael Damaceno de Assis - Diretor Paranaense da Comissão Nacional de Apoio ao Estudante de Direito (Paed) e Autor de Vários Artigos Jurídicos.
Marcelo Rezende - Jornalista e Apresentador Jornal da Rede TV News
Dr. Roberto Parentoni - Advogado Criminalista

Cerificado 14Horas/Aula

Inscrições apartir de 15 de Agosto.Pelo site que esta em criação.

Coordenador Executivo da I Jornada de Criminologia e Justiça Penal Dr. Bruno Bueno

terça-feira, 12 de junho de 2007

A VINCULAÇÃO AXIÓLOGICA ENTRE A FUNÇÃO DA PENA E A MODELO DE ESTADO

RAFAEL DAMACENO DE ASSIS
Graduando em Direito pela Faculdade Metropolitana IESB (Instituto de Educação Superior de Brasília.) Vice-Presidente do Centro Acadêmico Dr. João Tavares de Lima. Credenciado pela OAB/PR E10.433. Representante na cidade de Londrina da Associação Brasileira de Advogados ABA.


SUMÁRIO: 1. Introdução 2. A Função Da Pena Dentro De Estado Liberal 3. A Função Da Pena Dentro Do Estado Social 4. A Função Da Pena Dentro Do Modelo De Estado Social E Democrático De Direito 5. Referências

1. Introdução
O Estado, ante sua evolução histórica, passou por várias mudanças filosóficas até chegar hoje ao que chamamos de “Estado Social e Democrático de Direito”, o qual é adotado quase que praticamente em todos os países modernos, inclusive o Brasil, conforme disposição de nossa própria Constituição Federal no caput de seu artigo 1º.
A pena, concebida como instrumento característico de imposição estatal, teve sua função modificada ao longo dessas transformações.
Para que possa ser entendida a função da pena dentro do atual Estado Social e Democrático de Direito, faz-se necessária uma exposição do contexto histórico dos dois modelos de Estado que a precederam: o modelo de Estado Liberal e o de Estado Social, assim como seu papel dentro desses Estados.

2. A Função da Pena dentro de Estado Liberal

O Estado Liberal, surgido em contraposição ao modelo absolutista de Estado, era regido por um sistema jurídico emanado da vontade geral dos membros da sociedade, expressada por seus representantes políticos. Tanto os cidadãos como os poderes públicos estavam sujeitos tanto à constituição como a todo o restante do ordenamento jurídico. A essência do modelo liberal é a idéia de defender os membros da sociedade do autoritarismo imposto pelo Estado.
Dessa forma, a função da pena dentro do modelo liberal de Estado era a de retribuir o mal a quem ele havia cometido, ao cometer um delito, sendo que a fundamentação para sua aplicação erigia-se do contrato social celebrado entre os cidadãos membros deste Estado.
O modelo de Estado Liberal estava vinculado à Escola Clássica do Direito Penal, dos filósofos Kant e Hegel, segundo a qual a pena era concebida como um fim em si mesma, devendo ser um castigo imposto ao delinqüente em virtude de uma exigência absoluta de justiça, uma reafirmação do jus puniendi estatal.

3. A Função da Pena dentro do Estado Social

Se o modelo de Estado Liberal tinha por princípio a limitação da ação estatal, o Estado Social baseava-se na intervenção das relações sociais, como forma de desenvolvimento e de manutenção da própria sociedade.
Como visava a garantia da continuidade da vida em sociedade através de sua ação intervencionista, no Estado Social, a pena tinha como finalidade precípua o combate à delinqüência e à criminalidade.
A função da pena dentro do Estado Liberal estava diretamente relacionada ao contexto histórico do surgimento da Escola Positiva de Direito Penal (segunda metade do século XIX), e também da nova situação determinada pelo capitalismo, principalmente pelo surgimento da nova camada social denominada proletariado, que provocou vários desajustes sociais, sendo um deles o aumento significativo da criminalidade.
A função da pena dentro do modelo de Estado Social ia ao encontro da necessidade de um direito penal que visasse a prevenção de delitos, no qual a pena tivesse uma função mais utilitária, e não penas de pura e simples retribuição do mal pelo mal.



4. A Função da Pena dentro do Modelo de Estado Social de Democrático de Direito

A característica do Estado Social e Democrático de Direito era a de submeter à atuação do Estado aos limites legais estabelecidos pelo Estado de Direito, ou seja, era o intervencionismo estatal característico do Estado Social que respeitava as garantias dos indivíduos membros da sociedade, estabelecidas por meio de um ordenamento jurídico.
Dessa forma, no modelo Social e Democrático de Direito a função da pena não poderia se constituir numa arma do Estado contra a sociedade. O jus puniendi estatal deveria se subsumir às garantias do Estado de Direito e ao princípio da legalidade. A pena deve orientar-se pela sua função preventiva, visando à proteção exclusiva dos bens jurídicos, atendendo ao princípio da legalidade e da culpabilidade do criminoso.
Juntamente ao aspecto de prevenção geral intimidatória, a pena deve cumprir a sua função de prevenção geral estabilizadora e integradora, o que vem a ser a moderna teoria chamada de prevenção geral positiva, que vem a mitigar a idéia da pena como mero instrumento de intimidação estatal.
Assim, no modelo Social e Democrático de Estado, não se justifica a aplicação de uma pena se não for respeitado o princípio da legalidade, ou se ela atentar contra a dignidade humana (como penas de morte, de tortura, etc.) e, principalmente se ela não oferecer a possibilidade de ressocialização e de reinserção social do condenado, tendo um caráter exclusivamente retributivo.
Por fim, a pena é entendida como sendo um instrumento de política social exercida em benefício dos cidadãos, tendo como missão a garantia da proteção aos bens jurídicos, a manutenção da ordem social e, por fim, da vida em sociedade.

5. Referências:

PUIG, Santiago Mir. Funcion de la Pena y Teoria del Delito en el Estado Social y Democrático de Derecho. 2. ed. Barcelona. Bosch, 1989.

domingo, 8 de abril de 2007

EVOLUÇÃO DA IDÉIA DE PENA HUMANITÁRIA E SUA PROPOSTA RESSOCIALIZADORA


RAFAEL DAMACENO DE ASSIS
Graduando em Direito pela Faculdade Metropolitana IESB (Instituto de Educação Superior de Brasília.) Vice-Presidente do Centro Acadêmico Dr. João Tavares de Lima. Credenciado pela OAB/PR E10.433

EDUARDA GIACOMINI
Graduando em Direito pela PUC/PR, Estagiária do Ministério Público do Estado do Paraná.


SUMÁRIO: 1. Introdução 2. A pena de prisão desvirtuada 3. Um novo sistema pena 4. Conclusões 5. Referências.

1. Introdução

O sistema da repressão criminal veio mesmo a desenvolver-se no período humanitário, no século XVIII, que embora ainda trouxesse a idéia da retribuição pelo delito cometido, foi influenciado por pensadores como Cesare Beccaria, e quando ao invés de adotar-se a severidade das penas, numa época em que a tortura era a forma mais comum de se obter a confissão do réu e a sua conseqüente punição, buscou-se defender os direitos fundamentais do acusado.
Apenas neste século, com o movimento da Nova Defesa Social, encabeçado por Marc Ancel, foi que a política criminal, ciência na qual o Estado deve se basear para prevenir e reprimir a delinqüência, tomou um novo rumo, procurando-se cada vez mais a reinserção do criminoso de volta à sociedade e a prevenção do crime.
A pena de prisão, na realidade, deveria ser utilizada como último recurso para a punição do condenado, é o que preconiza o Direito Penal Mínimo. Entretanto, pela falta de estrutura do Estado, ela tem servido para retirar o indivíduo infrator do âmbito social e garantir segurança aos demais. Contudo, a pena privativa de liberdade não é apenas um meio de afastar aquele que cometeu um crime do seio da sociedade e mantê-lo à margem do convívio social, em virtude da sua “culpabilidade” e “periculosidade”. Deve ser também uma forma de dar-lhe condições para que se recupere e volte à vida em comunidade. Assim, se a pena é um mal necessário, é premente que se lhe dê uma concepção mais suavizada, voltando-se maior atenção ao condenado, seu destinatário, assegurando-lhe os direitos que lhe são inerentes, propiciando, destarte, sua preparação para o retorno à vida na sociedade.
São estas, inclusive, as propostas oficiais de finalidade da pena, quais sejam: antes de tudo, a punição retributiva do mal causado pelo criminoso; a prevenção da prática de novos delitos, de modo a intimidar o delinqüente para não mais cometê-los, bem como os demais integrantes da sociedade; e por fim, transformar o preso de criminoso em não-criminoso, ou seja, ressocializá-lo.
Hilde Kaufmann observa os males que o encarceramento provoca no preso e as dificuldades de um retorno à vida social, ao afirmar que “o preso é incapaz de viver em sociedade com outros indivíduos, por se compenetrar tão profundamente na cultura carcerária, o que ocorre com o preso de longa duração. A prisonização constitui grave problema que aprofunda as tendências criminais e anti-sociais”.

2. A pena de prisão desvirtuada

Mesmo com as tentativas de sua abolição, como fez-se com a tortura e a pena de morte, é, ainda, a pena privativa de liberdade a espinha dorsal de todo o sistema penal. Apenas, procura-se aplicá-la com um caráter mais excepcional, em consonância com a Teoria da Intervenção Mínima, até porque ela não se enquadra no Estado Democrático de Direito, nem no objetivo ressocializador da pena, cujo elemento nuclear é o desenvolvimento da personalidade e dignidade da pessoa. Mas, é tida como a única sanção aplicável em casos de grave criminalidade e de multireincidência.
Para fazer da prisão uma possibilidade de egresso da vida delituosa, os presídios têm que oferecer certas condições, daí porque a necessidade de classificação dos detentos. Faz-se imperioso a individualização do cumprimento das penas, significando a aplicação justa do tratamento dado ao preso, de acordo com o que ele é.
A ausência de critérios acomete, por exemplo, o preso acidental, que, por uma circunstância adversa, ingressa na prática delituosa e, ao adentrar a estrutura prisional, enterra lá suas esperanças de liberdade. Isso motivado pelo acúmulo irregular de encarcerados das mais diversas origens e apenados de acordo com os mais diferentes crimes.
Como podem, então, ser reintegrados ao meio social se são rejeitados por esta sociedade, se são confinados à força, privados de autonomia de vontade, de recursos, de bens de natureza pessoal, de relações heterossexuais, da família, da segurança, se são submetidos a um regime de controle quase total, tendo de se adequar às condições de vida que lhe são impostas?
A Constituição Federal procura velar pela integridade física e dignidade dos aprisionados, tendo sido expressa ao assegurar “o respeito à integridade física dos presos” (art.5º, XLIX). As Cartas anteriores já o consignavam, com pouca eficácia, referindo-se habitualmente a várias formas de agressão física a presos, a fim de extrair-lhes confissões de crimes. Ademais, a Carta Magna determinou que “ninguém será submetido a tortura ou a tratamento desumano ou degradante” (art.5º, III). Para dotar tais normas de aplicabilidade plena, preordenam-se as várias garantias penais adequadas, como o dever de comunicar, imediatamente, ao juiz competente e à família ou à pessoa indicada, a prisão de qualquer um e o local onde esteja confinado; e o dever da autoridade policial de informar ao preso os seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, garantida a assistência de advogado; e o direito do preso à identificação dos responsáveis por sua prisão e interrogatório.
A realidade fática, no entanto, é bem distinta. Os apenados são lançados à prisão sem qualquer critério de classificação, sendo abandonados pelo Estado e mantidos na ociosidade e no ódio pela sociedade que alí os flagelou. Ficam a passar pelas suas mentes uma forma de vingança por tudo a que são submetidos.


3. Um novo sistema penal

É preciso a transformação do sistema para que a reforma do condenado seja propiciada por instrumentos como a educação e o trabalho, de modo a dar-lhe condições de levar uma vida digna quando sair do estabelecimento prisional, e evitar que o cárcere seja mais penoso do que deve ser.
Isso até mesmo para que a pena de prisão entre em consonância com os princípios do Direito Penitenciário, quais sejam: a proteção dos direitos humanos do preso; o preso como membro da sociedade; a participação ativa do sentenciado na questão da reeducação e na sua reinserção social; a efetiva colaboração da comunidade no tratamento penitenciário, e a formação dos encarregados de modo que reaprendam o exercício da cidadania e o respeito ao ordenamento legal.
Tendo a pena privativa de liberdade o objetivo não apenas de afastar o criminoso da sociedade, mas, sobretudo, de excluí-lo com a finalidade de ressocializá-lo, note-se que a pena de prisão atinge o objetivo exatamente inverso ao adentrar no presídio, o apenado assume o seu papel social de um ser marginalizado, adquirindo as atitudes de um preso habitual e desenvolvendo cada vez mais a tendência criminosa, ao invés de anulá-la.
Deve-se ter em mente que a pena de prisão atual, é incapaz de trazer o condenado de volta ao convívio social considerando normal, sob o manto da lei e da moral. Por isso, a finalidade ressocializadora de tal pena é utópica. Citando Rupert Cross, Augusto Thompson conclui: “A ilusão de que a pena de prisão pode ser reformativa mostra-se altamente perniciosa, pois, enquanto permanecemos gravitando em torno dessa falácia abstemo-nos de examinar seriamente outras viáveis soluções para o problema penal”.
A tendência então, é buscar a execução das penas privativas de liberdade de uma forma mais digna, para que os condenados sejam sancionados sem que sejam atingidos, agredidos em seus direitos fundamentais, pois perde-se assim, todo o caráter sancionador e ressocializador da pena. Conforme comenta Evandro Lins e Silva, pois: “a pena de prisão, ninguém mais contesta, é um remédio opressivo e violento, de conseqüências devastadoras sobre a personalidade, e só deve ser aplicada”, última ratio”, aos reconhecidamente perigosos. É iniludível que o encarceramento do homem não melhora, nem o aperfeiçoa, nem corrige a falta cometida, nem o recupera para o retorno à vida em sociedade que ele perturbou com a sua conduta delituosa ”... Pelo menos da maneira como esta vem sendo executada nos dias atuais... O que as penas privativas de liberdade têm demonstrado é que o que se pratica ultimamente é um flagrante desrespeito aos Direitos Humanos.
E como leciona o mestre Alberto Silva Franco em Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial, 6ª ed. São Paulo,RT, 1997, p. 504,: “subordinar o condenado a uma pena desumana, cruel, porque inviabiliza um atendimento prisional racional; deixa o recluso sem esperanças de obter liberdade antes do termo final do tempo de condenação, não exerce sobre ele nenhuma influência positiva no sentido de reinserção social a desampara a própria sociedade na medida em que devolve o preso à vida societária, após um processo de reinserção às avessas, ou seja, uma dessocialização”.

4. Conclusão

Como já foi dito, a Constituição Federal, tratando dos direitos e garantias fundamentais a todos os cidadãos, visa resguardar um mínimo de dignidade do indivíduo. Depois da vida, o mais importante bem humano é a sua liberdade. A seguir, advém o direito à dignidade. Infelizmente, dignidade não é algo que vê com freqüência dentro de nossos presídios. A grande maioria de nossas prisões oferecem aos seus detentos, nada mais que condições sub-humanas e indignas, completamente contrárias ao prescrito na Declaração Universal dos Direitos Humanos, bem como avessa à nossa Constituição Federal. A realidade é que os presidiários brasileiros são maltratados, humilhados e desrespeitados em sua dignidade, contribuindo para que a esperança de seu reajuste desapareça justamente por causa do ambiente hostil que se lhe apresenta quando cruza os portões das prisões, se é que podemos chamar nossas cadeias e penitenciárias de prisões, uma vez que a reincidência na população penal é de 85%, segundo dados do IBGE, o que mostra que as penitenciárias não estão desempenhando a função de reabilitação dos detentos, ou seja, o que temos hoje no Brasil são verdadeiras masmorras, depósitos humanos de excluídos.
Tanto a qualidade de vida desumana quanto a prática de medidas como a tortura, por exemplo, dentro dos presídios, são fatores que impedem o ser humano de cumprir o seu papel de sujeito de direitos e deveres. A realidade é que essa situação não mudará da noite para o dia. Esta mudança requer vontade política, técnica e financeira necessárias, visando objetivos a curto, médio e longo prazo, mas em caráter de absoluta urgência. Necessita-se uma modernização da própria arquitetura penitenciária, com ampla assistência médica, psicológica e social, separação dos presos primários e reincidentes, projetos que envolvam trabalho, educação, esporte, entre outros.
Se o ser humano é a essência de todas as instituições, o aperfeiçoamento do aparelho penitenciário exige uma abordagem humanista, que vise desenvolver e dignificar o presidiário, já que os presos, em sua maioria, são jovens vindos das camadas sociais mais pobres, que já são marginalizados pela sociedade, e que não têm, na maioria das vezes, estrutura familiar, educação ou formação profissional. São pessoas em situações já delicadas e que se não encontrarem as devidas condições necessárias nos presídios, jamais voltarão à sociedade como cidadãos do bem.
Dessa forma, a pena aplicada a um ser humano que comete um crime deve ser reabilitadora, construtiva e ajudar a amadurecer idéias. Deve dar a oportunidade do infrator sair da prisão pronto para enfrentar a sociedade de igual para igual, com trabalho, educação, respeito e acima de tudo, dignidade. A pena não deve ser aplicada ao infrator em seu corpo físico, como frequentemente ocorre, mas é preciso que ele tenha uma marca na alma, no intelecto.

5. Referências

BECCARIA, Cesare Bonesana, Marchesi di, Dos Delitos e das Penas – tradução J. Cretella Jr. e Agnes Cretella I. – 2a ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999.

THOMPSON, Augusto. A Questão Penitenciária. 5a ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

VARELLA, Dráuzio. Estação Carandiru. 18a reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.

ZAFFARONI, Eugênio Raul & PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro – Parte Geral. 2a ed. São Paulo: RT, 1999.





quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

OBJETIVO DAS PRISÕES, RESSOCIALIZAÇÃO OU PUNIÇÃO?


RAFAEL DAMACENO DE ASSIS
Acadêmico de Direito, ex-estagiário do Tribunal de Justiça do Paraná e Vara de Execuções Penais da Comarca de Londrina.
MARCIO ZUBA DE OLIVA
Advogado. Especialista em Direito e Processo Penal pela Universidade Estadual de Londrina.

SUMÁRIO: 1. Introdução 2. Efeitos Negativos Causados Pela Prisão Sobre A Pessoa Do Encarcerado 3. A Sociedade Paralela Existente Dentro Das Prisões 4. O Poder Paralelo Exercido Por Facções Criminosas No Interior Das Prisões 5. Bibliografia


1. INTRODUÇÃO

A prisão tem como fundamentação filosófica à confinação como sendo a aprendizagem do isolamento. Segregado da família, dos amigos e de outras relações socialmente significativas, espera-se que o preso, cotidianamente, venha a refletir sobre seu ato criminoso, sendo este o reflexo mais direto de sua punição.
Assim, a sociedade impõe ao preso o isolamento como uma punição de natureza moral, como uma reafirmação do direito por ele negado, ou seja, pela prática de um crime.
No entanto, a filosofia estatal quando da aplicação da pena, vai além da mera imposição de um castigo. A prisão teoricamente deveria servir como uma empresa transformadora, na qual o preso será exposto à técnicas de disciplinamento e de reconstrução moral.
A prisão se constituiria então numa instituição na qual o Estado, através dos recursos financeiros obtidos junto aos cidadãos (contribuintes), proporcionaria aos indivíduos que praticaram delitos o seu isolamento, de forma a ressocializá-los e credenciá-los ao retorno ao convívio social. Esse seria o objetivo legítimo de uma instituição prisional e da aplicação da pena privativa de liberdade.
Já numa análise superficial percebemos o total desvirtuamento da filosofia prisional para com a atual realidade de nosso sistema carcerário. Em exame aos tópicos anteriormente tratados, pode-se concluir que em nosso atual sistema prisional, a pena tem cumprido apenas o seu caráter retributivo, apenas impondo um castigo ao condenado, sem lhe proporcionar sua recuperação e sua conseqüente reinserção social.
Da ineficácia ressocializadora das prisões e das mazelas existentes em nosso sistema penitenciário e o do que trataremos nos tópicos seguintes.

2. EFEITOS NEGATIVOS CAUSADOS PELA PRISÃO SOBRE A PESSOA DO ENCARCERADO

É unânime a opinião de que o ambiente carcerário, meio artificial e antinatural, não permite realizar nenhum trabalho ressocializador sobre a pessoa do condenado. De forma oposta à reabilitação, a reclusão oferece os mais variados tipos de efeitos negativos que podem ser causados a um ser humano, como a fome, os castigos físicos, a promiscuidade sexual, o vício, a expurgação das relações familiares, e muitas vezes até mesmo a própria morte.
No entanto, além dos fatores acima mencionados, um dos quais pode ser tido como de maior empecilho no papel ressocializador da pena privativa de liberdade é fato de o prisioneiro ser inserido num novo contexto social, que é a sociedade paralela existente dentro dos estabelecimentos prisionais, o que acaba arraigando em sua personalidade a subcultura carcerária, que vem acarretar danos psicológicos e sociais irreparáveis a sua pessoa.

Como primeira conseqüência negativa do ambiente penitenciário tem-se a debilidade de saúde que o ambiente insalubre das prisões provoca nos reclusos. As deficiências das celas e da alimentação facilitam a proliferação de várias doenças, dentre elas, a tuberculose, enfermidade corriqueira nas prisões.
Além desta, por não terem tratamento médico preventivo e curativo adequado, os detentos são acometidos dos mais variados tipos de enfermidade, o que acaba transformando as prisões num grave problema não apenas de segurança, mas também de saúde pública, como será tratado pormenorizadamente em item próprio a posteriori neste trabalho.
O ostracismo e o ócio do recluso, aliados a uma alimentação deficiente e ainda à falta de atividades físicas, acabam fragilizando sua saúde, tornando-o mais vulnerável e suscetível de adoecer. Sua capacidade laborativa também acaba sendo reduzida, tornando-se mais um fator impeditivo de sua reinserção no mercado de trabalho, quando do seu retorno ao convívio social.
São ainda inúmeros os prejuízos sociais causados ao recluso. O primeiro deles é o fato de que a segregação do meio social do qual ele integrara ocasiona uma desadaptação tão profunda que torna praticamente impossível uma posterior reinserção social do delinqüente a este mesmo meio. Ao contrário disso, o isolamento da prisão e a aculturação junto aos demais detentos já integrados ao convívio carcerário acabam transformando a prisão num fator de influência criminógena, que ao invés de ressocializar o apenado acaba o levando à reincidência, e, conseqüentemente de volta à prisão.
Apesar de não haver índices nem estatísticas concretas, está diretamente verificada a presunção de que a pena privativa de liberdade não possui um caráter efetivamente reabilitador, quando podemos constatar de fato o alto número de reincidência dos ex-detentos.
A grande maioria daqueles que cumprem pena e que, através de uma possibilidade legal, adquirem o direito de voltar ao convívio social, acabam não permanecendo nele por muito tempo, pois sem terem muitas alternativas, pelo fato de não encontrarem trabalho que garanta o seu sustento e o de sua família, e pela discriminação de não serem aceitos pelos demais membros da sociedade, eles acabam retornando ao mundo do crime.
Torna-se mais difícil ainda a situação de reintegração social do egresso, principalmente no tocante à sua recolocação profissional, pois vivemos hoje a realidade de um mundo globalizado e em crescente processo de automatização da força de trabalho, o qual não consegue absorver nem mesmo o grande contingente de trabalhadores desempregados, e que ainda na maioria das vezes ainda contam com experiência profissional. O que se dirá então de uma pessoa que traz consigo o estigma de ex-presidiário, e que na maioria das vezes não tem qualquer qualificação profissional?
São incontáveis também os danos psicológicos causados à pessoa do recluso. Os traumas, humilhações e depressões sofridas na prisão dificilmente são por ele superados na sua vida pós-cárcere.
O primeiro efeito da prisão é a mortificação do ego e a prisionalização do indivíduo. A prisionalização é forma pela qual é imposta coercitivamente ao preso a (sub)cultura carcerária. Na verdade, pode-se dizer que se trata de um processo de aprendizagem constituído numa “dessocialização” do ser humano.
Neste processo, o recluso adapta-se às formas de vida e os costumes impostos pelos próprios internos do estabelecimento penal, pois não tem outra alternativa. Esse conjunto de regras na verdade é um sistema normativo autônomo que coexiste paralelamente ao sistema oficial de valores.
Muitas vezes tem-se a falsa idéia de que um preso de bom comportamento seja um homem regenerado e pronto a retornar ao convívio social. No entanto, trata-se apenas de um homem “prisionalizado”, que foi disciplinado a conviver com as regras impostas pela subcultura do ambiente da prisão, como meio de se manter vivo e a não sofrer os castigos disciplinares relativos ao descumprimento deste código de conduta e, por fim, para poder ser aceito no grupo.
O homem que até então nunca convivera numa prisão, acaba se amoldando a ela e ao perfil dos encarcerados contumazes, que lá já habitavam, tornando-se assim fruto do meio onde vive, devido à influência causada pelos fatores da prisionalização. Quanto maior for o tempo de reclusão tão maior será o grau de prisionalização do réu, o que tornará ainda mais obstaculosa a sua reabilitação.
A depressão e os mais variados tipos de psicoses também são conseqüências comumente verificadas naqueles que permaneceram encarcerados por longos períodos. Quando a prisão não acaba deixando o homem cheio de distúrbios psicológicos, o que em determinadas vezes acaba até mesmo o tornando um psicopata ao adquirir a liberdade, ela por vezes acaba o levando à morte dentro dela própria, haja vista a elevada taxa de suicídios verificada dentre aqueles condenados à penas de longa duração.
A ausência de relações humanas, de ocupações como o próprio trabalho e o tratamento frio e muitas vezes desumano dos funcionários penitenciários acabam tornando o preso um indivíduo cheio de rancor, agressividade e extremamente depressivo.
Outro grave efeito psicológico causado pelo aprisionamento são os danos causados pelos problemas sexuais que ocorrem no interior das prisões. Ignora-se o fato de que as atividades sexuais de um homem não terminam a partir do momento que este é recolhido à prisão. A atividade sexual é um instinto biológico inegável e irreprimível, inerente à própria natureza humana.
A repressão do instinto sexual propicia a perversão da esfera sexual e da personalidade do indivíduo. Dessa forma, é quase que impossível se falar em ressocialização num ambiente que impede e reprime um dos instintos mais naturais e fundamentais do homem.
Além dos problemas sexuais dos quais o preso é acometido dentro da própria prisão, ao ser libertado, ele leva consigo vários fatores que impedem o retorno a uma vida sexual normal, sejam esses problemas de natureza psicológica, como complexo de culpa pelas relações homossexuais que mantinha na prisão, falta de apetite sexual, dificuldades para retornar à vida matrimonial sexual; ou de natureza biológica, como impotência sexual, ejaculação precoce, doenças venéreas, etc.
Com relação ao homossexualismo, esta é uma prática sexual comum dentro dos estabelecimentos prisionais. As violências sexuais praticadas contra alguns detentos e a supressão das relações heterossexuais são geralmente as condições que acabam influindo decisivamente para a proliferação da homossexualidade no interior das prisões.
Como forma de atenuar a tensão e a agressividade provocada nos internos devido à abstinência sexual foi implantada no sistema carcerário a visita íntima, que não obstante ter vários argumentos em seu favor, ela veio apenas atuar como um paliativo em relação aos problemas da sexualidade dos presos.
O primeiro argumento em desfavor da visita íntima se prende ao fato de ela ter de certa forma um caráter discriminatório, pois só podem usufruir desse benefício àqueles que tem esposas ou companheiras, não podendo efetivamente dele gozar os presos que são solteiros.
Porém, o que tem ocorrido na realidade, tem sido o fato de a visita íntima se tornar muitas vezes uma forma de prostituição e da prática de abusos sexuais.
Em virtude do poder paralelo exercido pelos detentos que possuem o domínio da massa carcerária dentro dos presídios, e da relação de subordinação e dependência dessa massa para com aqueles que possuem esse domínio, muitas vezes os presos que têm esposas ou companheiras, e que, por um motivo ou outro tenham uma certa “dívida” com o aquele que detém o poder paralelo dentro do presídio, acaba tendo de permitir que sua referida esposa ou amásia venha a manter relações sexuais com aquele ou com outros presos, como única forma de manter-se vivo e não vir a sofrer qualquer tipo de sanção ou castigo impostos por outros presos, a quem este deva obediência e subordinação.
Seria uma alternativa ao atual sistema permitir que o preso pudesse ter na verdade uma visita familiar, em local adequado, e durante um determinado período. No entanto, difícil seria de se concretizar essa sugestão em nosso sistema penitenciário, o qual ainda não é capaz de propiciar nem mesmo as garantias mínimas previstas ao recluso.

3. A SOCIEDADE PARALELA EXISTENTE DENTRO DAS PRISÕES

A vida no ambiente de uma prisão na verdade, é a vida dentro de uma sociedade marginalizada, que é constituída de forma paralela à sociedade comum. Por ter natureza praticamente de uma sociedade autônoma, a sociedade formada pelos presos tem um regramento que lhe é peculiar, o qual basicamente tem como princípio fundamental a sobreposição em relação aos demais daquele que é tido como o mais forte ou o mais poderoso. Pode-se dizer que essas regras baseiam-se num direito natural, semelhante àquele vigente nas sociedades mais primitivas.
Pode-se afirmar que a existência deste meio social paralelo é determinada pela existência de dois fatores, um constituindo-se como sua causa e outro como sua conseqüência. A causa estaria relacionada à necessidade da existência de um conjunto de regras que pudessem tornar suportável a sobrevivência e a convivência dos presos em comunidade. Esse código de conduta seria a materialização da sua auto-regulamentação, visando buscar a sua autopreservação e o seu convívio pacífico.
Já como conseqüência direta relacionada à gênese desse novo grupo social, seria o efeito da sedimentação na personalidade do preso da já anteriormente citada “subcultura carcerária”, decorrente do encarceramento prolongado do indivíduo e da segregação do meio social do qual ele fazia parte.
Dentro desse ordenamento dos presos emanam regras de um direito penal próprio, o qual tem princípios que lhe são característicos, mas que, no entanto, muitas vezes não possuem qualquer racionalidade ou proporcionalidade. Essas regras imperam dentro das prisões e não são alcançadas pelo poder constituído de nossas autoridades públicas. Dentre elas, determinados comportamentos como a delação de um companheiro, não saldar uma dívida contraída ou a condenação pela prática de um crime de natureza sexual equivalem a uma correspondente sentença de morte dentro da cadeia.
Como exemplo prático do poder exercido dentro deste submundo carcerário, podemos citar a matéria apresentada pela Revista Veja[1], a qual trata da figura dos encarregados gerais pela faxina nos pavilhões da Casa de Detenção, o maior presídio de São Paulo. Esses presos são de alta confiança da administração penitenciária e se constituem numa espécie de autoridade moral da cadeia, uma espécie de casta dirigente entre os demais presos. Eles também se constituem num elo entre a administração do presídio e os internos, tendo um grande poder de articulação entre ambos os lados, e se tornando uma peça fundamental no equilíbrio interno de um presídio.
O poder exercido por esse representante, eleito pelas duas partes (presos e administração), é tamanho a ponto de ele ter poder de veto sobre determinadas atitudes a serem praticadas pelos presos, como um acerto de contas, o assassinato de um outro preso, ou até mesmo de um eventual plano de fuga ou rebelião. A figura desse preso “especial” dentro do presídio é sempre ocupada por um detento que detém uma habilidade política muito grande, o qual além de manter boas relações com a direção do presídio deve demonstrar que não está mancomunado aos demais presos. Também não pode causar a esses a impressão de que passou para o lado contrário, o que acarretará a sua completa desmoralização perante seus companheiros, o que poderá posteriormente acabar lhe custando sua própria vida.

4. O PODER PARALELO EXERCIDO POR FACÇÕES CRIMINOSAS NO INTERIOR DAS PRISÕES

Se por um lado os presos vivem dentro de uma sociedade própria, regida por regras marginais por eles constituídas, muitos deles continuam a interagir no meio social externo, por meio de um poder paralelo que, embora na maioria das vezes as autoridades neguem sua existência, ele tem se demonstrado coeso, crescente, e difícil de ser combatido.
Nem mesmo o encarceramento e o isolamento de indivíduos nocivos à sociedade tem sido o suficiente no combate ao crime organizado. Constantemente nos tem sido trazido à tona pelos meios de comunicação o fato de que essas organizações continuam exercendo suas atividades criminosas mesmo de dentro da prisão. O exercício deste poder paralelo é decorrente de uma série de falhas e de negligências das autoridades responsáveis, ou seja, do poder legalmente constituído.
A falta de organização e de efetividade de nosso sistema penitenciário deu margem para o surgimento de várias facções criminosas que atuam de forma organizada e específica dentro deste próprio sistema. Essas organizações possuem um grande poder de mobilização assim como também uma grande adesão entre os detentos. A constituição desse verdadeiro sistema paralelo não é recente, sendo que sua expansão foi negligenciada pelas autoridades, até o movimento tomar proporções incontroláveis, e ocorrerem fatos como o do dia 18 de Fevereiro de 2001, quando a facção criminosa autodenominada PCC – “Primeiro Comando da Capital” – deflagrou a maior rebelião da história do sistema penitenciário brasileiro.
Como foi veiculado pela imprensa, numa ação orquestrada sob o comando de marginais líderes desse grupo criminoso, foi promovida uma rebelião simultânea em 24 presídios situados em 19 cidades do Estado de São Paulo, deixando aproximadamente 7.000 reféns sob o controle de mais de 27.000 presos amotinados, totalizando um saldo final de 19 presos mortos, além de enormes prejuízos materiais devidos à destruição causada em todos esses estabelecimentos prisionais.
Depois de deflagrada essa mega-rebelião, foi demonstrado o poder de força e de mobilização que possuía essa organização, a qual se constitui numa espécie de associação sindical de criminosos perigosos, e que se mantêm à custa de arrecadações de dinheiro junto aos demais presos, mediante sua extorsão ou de seus familiares, e também em decorrência do tráfico de drogas, por ela controlado, dentro dos presídios. Posteriormente chegou ao conhecimento das autoridades informações de que a referida organização já conta com mais de 12.000 membros, capazes de serem mobilizados a partir de uma simples ordem dada dentro da própria prisão, e que a facção tinha inclusive planejado o assassinato do Secretário da Administração Penitenciária do Estado de São Paulo, Nagashi Furukawa.
Episódios como a das rebeliões iniciadas pelo PCC e ainda os mais recentes como a revolução provocada pelo traficante “Fernandinho Beira-mar” em Bangu I, no Rio de Janeiro, demonstram que uma das grandes falhas do sistema penitenciário brasileiro é a de não conseguir debelar as ações do crime organizado nem mesmo quando seus integrantes estão recolhidos nos estabelecimentos prisionais, locais onde eles deveriam permanecer isolados da sociedade, cumprindo sua pena e sem quaisquer condições de prosseguirem em suas atividades criminosas.
No entanto, cabe ressaltar a agravante de que essas situações não se constituem em fatos isolados dentro do sistema penitenciário, mas sim numa realidade constante e corriqueira, o fato de o crime organizado não ter suas ações reprimidas mesmo com o encarceramento de seus integrantes.

5. BIBLIOGRAFIA

JESUS, Damásio E. de. Sistema penal brasileiro: execução das penas no Brasil. Revista Consulex. Ano I, n. 1, p. 24-28, Jan. 1997.
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. 1. ed. São Paulo. Edipro, 1999.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão. 3. ed. Revista dos Tribunais. São Paulo, 1993.
DOTTI, Rene Ariel. Bases alternativas para um sistema de penas. 2. ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 1998.
MIRABETE, Julio Fabrini. Execução Penal: Comentários à Lei nº 7.210 de 11 de Julho de 1984. 9. ed. São Paulo. Atlas, 2000.
OLIVEIRA, Edmundo. O futuro alternativo das prisões. 1. ed. Rio de Janeiro. Forense, 2002.
PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro – Parte Geral 1. ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 1999.
OYAMA, Thaís. Os donos do Inferno. Revista Veja. n. 1629, p. 62-26, 05 de Novembro de 2000.

[1] OYAMA, Thaís. Os donos do Inferno. Revista Veja. n. 1629, p. 62-26, 05 de Novembro de 2000.

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007

UMA VISÃO DIFERENCIADA DO DIREITO À IGUALDADE


RAFAEL DAMACENO DE ASSIS
Acadêmico de Direito, ex-estagiário do Tribunal de Justiça do Paraná e Vara de Execuções Penais da Comarca de Londrina.


SUMÁRIO: 1. Introdução 2. Desigualdade e Pobreza 3. Responsabilidade do Estado 4. Urbanização e Criminalidade 5. O estigma da pobreza. 6. Considerações Finais.


1. Introdução.

Terá havido no mundo alguma sociedade realmente igualitária na qual os homens desfrutassem de maneira semelhante aos bens e oportunidades da vida social? Parecem que não. As evidências históricas mostram que a cultura humana esteve sempre intimamente ligada, desde seus primórdios, à idéia da distinção e da discriminação entre grupos sociais. Mesmo nas sociedades homogêneas e simples existiam diferenças de sexo, idade atribuindo aos grupos assim discriminados funções diferentes, certa parcela de poder, determinados direitos e deveres. A partir de então, nas sociedades que foram se tornando mais complexas, os membros não tinham igual acesso a certas vantagens como, por exemplo, poder de decisão e a liberdade. O patriarcado existente nas mais remotas civilizações, garantido aos homens o poder sobre a família e seus bens, demonstra que a igualdade é, antes que mais nada, uma utopia, um ideal ainda não vivido pela humanidade.
Por outro lado, o processo histórico tem revelado como uma tendência marcante à diferenciação e a crescente complexidade da sociedade.

2. Desigualdade e Pobreza.

Se é verdade que a sociedade desde a Antigüidade apresentam diferentes formas de discriminação e de desigualdade de bens, por que a pobreza se torna tão pouco aceitável na sociedade contemporânea? Por que a existência de parcelas a margem dos benefícios do desenvolvimento industrial e sem acesso a quantidade mínima de bens parece tão chocante hoje?
A razão por esta postura diante de populações excluídas ou carentes se deve inicialmente ao fato de que a sociedade moderna, nos últimos séculos, sedimentou-se a idéia de que fazemos parte de uma totalidade que é a humanidade. Ao contrário dos povos antigos, que tinham muito clara a noção de que a sociedade se diferenciava por grupos inconciliáveis, o mundo ocidental desenvolveu a consciência de constituir uma humanidade a qual pertencem todos os habitantes do planeta. Uma igualdade, sem dúvida nenhuma, originada no universalismo católico, desenvolvida pelos princípios democráticos de organização política e reforçada pela expansão mundial do sistema capitalista industrial.
Engendrada a idéia que a humanidade como conceito capaz de conter seus limites todas as pessoas existentes no planeta, as desigualdades sociais se tornaram cada vez mais perceptíveis. Defendido o princípio de que todos são iguais perante a lei, ficando assim cada vez mais difícil justificar as diferenças sociais.

3. A responsabilidade do Estado.

Desde que se constituiu na Idade Moderna, o Estado, foi adquirindo sempre mais poder e desenvolvendo um caráter acentualmente regulador da vida social. Sendo o responsável pela política econômica nacional, pelos programas sociais, pelas relações internas e externas, tornou-se o responsável pelas condições de vida dos seus cidadãos. Todos esses aspectos resultaram de uma ampliação significativa da suas atribuições e funções.
O Estado, enquanto instituição representativa da sociedade como um todo, passou a ser responsabilizado também pelo bem-estar social. Não sem certa razão, na medida em que é ele que regula os mecanismo de distribuição de renda, por meio de controle de salário mínimo, preços de produtos, impostos e financiamentos. Conseqüentemente, é ele também responsável pelo crescimento galopante da pobreza no mundo.
Essa responsabilidade do Estado para com a população carente de uma nação parece não tender a diminuir sequer na atualidade, quando se avaliam suas atribuições e se verifica uma nítida tendência ao “enxugamento” de suas funções nas diversas nações. Mesmo que não se almeja um Estado que não intervenha na economia, permitindo que o mercado seja auto-regulamentado, ninguém pretende eximi-lo de suas responsabilidades para com a saúde, a educação e as populações pobres.
Tanto mais quando se sabe que as relações internacionais de mercado têm sido responsáveis pelo que passou a se chamar “dumping social” existência de salários ínfimos nos países em desenvolvimento para que seus produtos possam competir com os países desenvolvidos e industrializados. Os interesses econômicos que essa política defende tem nefastas conseqüências para a vida social, como a perda de conquistas duramente conseguidas pelos trabalhadores. Espera-se assim que o Estado representando a sociedade com um todo, tanto ricos como pobres, tanto trabalhadores como empresários, assim amenizando esta desigualdade social.
Portanto, se a responsabilidade do Estado em relação à pobreza foi maior nas economias dirigidas e centralizadas, ainda hoje se exigem medidas para a crescente pobreza de parte da população. Quais são estas medidas e que políticas se acredita que o Estado poderia se desenvolver no sentido de minimizar desigualdades sociais.
Espera-se que o Estado promova a reforma agrária, diminuindo a concentração de terras e assegurando a permanência da população rural no campo. Concomitantemente, o Estado deve desenvolver uma política de créditos agrícolas capaz de auxiliar os pequenos proprietários rurais.
Propor também programas estatais de combate à pobreza, medidas de contenção da hiperurbanização, responsáveis pelas grandes misérias nas grandes cidades. A descentralização da industria e a flexibilidade nas atividades econômicas deve permitir uma melhor redistribuição de renda entre regiões, diminuindo o domínio de uma região sobre a outra.
Não há duvida que existem sistemas cujo desenvolvimento assegura uma melhor distribuição dos bens sociais, que prevêem formas mais adequadas de assistência à população.

4. Urbanização e Criminalidade

O desconcertante fenômeno do aumento da pobreza crônica tem sido explicado como efeito da atração dos centros urbanos sobre um setor agrário também empobrecido. As taxas indicam que cerca de 35% da população pobre dos centros urbano são compostas por migrantes.
Essa explicação é inquietante não por mostrar que o setor agrário tente a expandir trabalhadores, pois essa parece ser uma característica do processo de industrialização e de racionalização do trabalho com o uso de maquinas e de mão-de-obra assalariada sazonal.
A percepção da incompetência do sistema econômico e político se soma o desconforto de saber que, nos grandes centros milhares de pessoas não se encontram sob a vigilância das instituições sociais, vivem como podem, à deriva e a revelia dos planejamentos oficiais. Cria-se, em relação a essa população um sentimento de desconfiança e de insegurança. Há uma relação entre o crescimento dessa população e o aumento da criminalidade nos grandes centros urbanos, que se evidencia tanto a mídia como nos estudos científicos.
O perfil dos criminosos também ajuda a reforçar essa associação entre pobreza e criminalidade: os autores dos crimes oficialmente denunciados são geralmente analfabetos, trabalhadores braçais e predominantemente de cor negra.
Conclui que a pratica policial preconceituosa, somada a desproteção das classes subalternas, torna a relação entre pobreza e criminalidade uma profecia autocumprida. Forma-se um círculo vicioso em que o individuo, para ter trabalho precisa ter domicilio, registro, carteira profissional e uma situação civil legal. Impossibilitado de trabalhar por não cumprir tais exigências, ele passa a engrossar as fileiras de marginalizados que vivem sob constante vigilância policial.

5. O estigma da pobreza.

Sabemos que o estado mostra-se incompetente no combate à pobreza e que as medidas publicas tem sido mais de policiamento, vigilância e violência do que de resolução do problema. Iniciativas de caráter assistencial têm resultados paliativos, enquanto a impressa exibe em cores cada vez mais realistas a indigência da população pobre. E agora graças à globalização dos meios de comunicação, a pobreza dos países em desenvolvimento se transforma em manchete internacional.
Cada vez mais a pobreza é estigmatizada, quer pelo caráter de denuncia da falência da sociedade e do Estado em relação as suas funções junto à população, quer pelo contraste com a abundancia de produtos, quer pelo perigo iminente de convulsão social que para ela aponta. A violência e a agressividade aumentam, criando um clima de guerra civil nas grandes cidades. Generalizam-se medidas arbitrárias de violência e brutalidade as chacinas, os linchamentos e os assassinatos.
O distanciamento, social e ideológico, a alienação, a discriminação e a estigmatizarão que recaem sobre a pobreza não ajudam a encontrar soluções para o problema nem evitando que as desigualdades sociais aumentam, principalmente agora que falências das economias coletivas no mundo colocaram o liberalismo como tendência universal. Por mais eficiente que o sistema liberal seja para o desenvolvimento da sociedade tecnológica e do capital, não podemos esquecer que eles têm graves conseqüências para aqueles setores sociais que, não possuindo qualquer capital, tem desempenhado um papel indispensável na acumulação de bens e riqueza por parte dos grupos dominantes.

6. Considerações Finais
É diante disso tudo que a pobreza para um fenômeno constante e assustador, que exige medidas conscientes e responsáveis. Um esforço conjunto se faz necessário envolvendo políticas estatais, como os bancos dos povos, e a criação de organizações não-governamentais que desenvolvam projeto de assistência social, alfabetização e capacitação para o trabalho.
Afinal, se a economia tende a crescer e a se desenvolver, e se a jornada de trabalho e os números de empregados diminuem, devem restar no futuro pessoas e tempo que podem ser destinados a este fim. Não podemos esquecer, entretanto, que a opção de um sistema político que favoreça uma integração maior da população em geral à sociedade ainda é a forma mais eficiente de combater à pobreza.

domingo, 18 de fevereiro de 2007

A VEEMÊNCIA DA RESSOCIALIZAÇÃO NA ERA DAS FACÇÕES CRIMINOSAS


MÁRCIO ZUBA DE OLIVA
Advogado; Pós-Graduado em Direito e Processo Penal na UEL/PR.

RAFAEL DAMACENO DE ASSIS
Acadêmico do 4º ano do Curso de Direito da Faculdade Metropolitana IESB, Londrina/PR.


SUMÁRIO. 1. Introdução 2. A ressocialização como finalidade da execução da pena privativa de liberdade 3. O risco social diante da atuação das Organizações Criminosas 4. Conclusões 5. Referências Bibliográficas.


1. Introdução

A expectativa que se faz em torno da pena de prisão bem como do encarceramento de determinados criminosos rotulados como “chefes do crime”, transmitem a sociedade uma falsa ilusão de segurança, punidade e de dever cumprido pela autoridade Estatal.
Diante disso vemos que a simples prisão ou até mesmo a condenação efetiva desses marginais não é suficiente para fazer cessar a máquina criminosa. Ao contrário, as prisões constituem fábricas indiretas de delinqüentes[1].
A legislação brasileira acerca do sistema prisional dispõe sobre a necessária individualização penal a fim de se vislumbrar um planejamento ressocializador eficaz além de obstar a dessocialização. No entanto, tal medida não é respeitada o que por conseqüência afronta os direitos e garantias fundamentais do preso.
A problemática da pena de prisão nunca deixou de ser um tema atual, entretanto, é preciso que se recorra à privação da liberdade apenas em casos extremos, ou seja, quando o direito penal for indispensável à estabilidade do corpo social. O congresso da ONU realizado em 1995, já apontava no seu contexto final medidas emergentes para o caos mundial, citando dentre as soluções a implantação de penas alternativas.
A busca incansável por métodos e programas que ajudem a facilitar a implantação de políticas públicas no sistema penitenciário, visando seu desafogamento e prosperando uma real reintegração social do apenado é o ideal primeiro a ser perseguido.
Neste esteio, não devemos renunciar à busca de uma solução razoável e que se aproxime o mais possível do ideal[2], pois a contrário sensu a sociedade será dominada pelo terror.

2. A Ressocialização como finalidade da execução da pena privativa de liberdade.

Falar de luta contra o crime significa, hoje, assinalar uma finalidade ao direito penal, qual seja, à pena[3]. Apesar de inserida na Lei de Execução Penal à perspectiva de recuperação do condenado e sua readequação ao convívio social, presenciamos que os fins propostos pela sanção penal não passa de uma falácia, e o Estado além de não ter controle da comunidade carcerária existente, interveêm de maneira falha e tardia. Logo, como reflexo imediato, existe uma execução penal “primitiva” que necessita de constantes reparos, a fim de evitar a dessocialização do criminoso.
Dessa forma, em não havendo o estabelecimento de políticas sérias de melhoramento social, a vala comum da prisão irá se aumentar cada vez mais, pois o cerne da delinqüência está mais na ausência de oportunidades do que na própria maldade do ser humano.
A crise da pena privativa de liberdade é bem retratada por Cezar Roberto Bitencourt que aponta alguns efeitos negativos dela: problema do autoconceito do recluso; problema sexual na penitenciária; violência carcerária; elevados índices de reincidência; anulação da personalidade do recluso etc.[4]
Tais abusos consistem também, na não separação dos presos pela idade, pela natureza da infração, condição processual dentre outros infinitos métodos previstos legalmente.
Haja vista, os inúmeros problemas relacionados com a Execução Penal no Brasil, vislumbra-se que o melhor caminho a ser seguido não é o da reclusão e sim o da aplicação de penas alternativas, tais como, prestação de serviços à comunidade, doação de alimentos aos necessitados, enfim, penas que não retiram o condenado do meio social além de impor-lhe uma responsabilidade habitual. A execução da pena é o primeiro e o último momento em que se torna possível a ressocialização.
Só assim, a superlotação dos presídios que hoje é tormento para a sociedade irá diminuir e a ressocialização do apenado com pena privativa de liberdade será efetivada.

3. O risco social diante da atuação das Organizações Criminosas

As Organizações Criminosas surgiram a partir da explosão populacional nas cadeias e das condições de vida precária que nelas vigorava. Organizar-se era uma forma de se proteger, evitando assassinatos e estupros por outros presos. Era também uma maneira de tentar dialogar com as autoridades e reivindicar melhores condições de vida na prisão.
Neste escopo de combater as injustiças, desigualdades e ofensas aos direitos individuais geradas dentro do sistema prisional as atividades das Organizações Criminosas foram se intensificando. Com o passar do tempo o número de adeptos crescia e seus seguidores se profissionalizavam no mundo do crime. Tal situação se revela preocupante, o perfil desse novo criminoso é diferente, pois ele não assalta, não consome ou vende drogas, foi treinado por muito tempo para obedecer à ordem e possui uma qualidade diferenciada da cidadania comum: o civismo patriótico[5].
Dentre inúmeros fatores que assolam o chamado Crime Organizado a influência que este exerce no tratamento ressocializador de muitos condenados é altamente aviltante para o Estado. A fragilidade e impotência demonstrada pelo Estado é bem retratada por Edmundo Oliveira.
“A prisão se apresenta como um espetáculo deprimente, atingindo além da pessoa do delinqüente; orfana filhos de pai vivo; enviúva a esposa de marido combalido; prejudica o credor do preso tornado insolvente; desadapta o encarcerado à sociedade; suscita graves conflitos sexuais; onera o Estado; amontoa seres humanos em jaulas sujas, úmidas, onde vegetam em olímpica promiscuidade”[6].

Emerge uma política criminal de emergência, onde o Estado deve buscar o equilíbrio entre a defesa da sociedade e a salvaguarda do mínimo vital dos condenados, pois, caso contrário estamos condizentes a atuação criminosas dessas organizações.
Basta entender que o Direito Penal é o instrumento mais opressivo e deve ter a resposta mais áspera de que os demais ramos de controle social, entendendo ainda que o sistema falhou e que o Direito Penal não é campo para elucubrações e teorizações que não se amoldam ao atual plano social do país.

4. Conclusões

A falência do sistema penitenciário é uma realidade, sendo apenas combatível por posturas que se importem mais com o recluso. A ressocialização do preso consiste na humanização da própria execução penal, que não só permitirá ao condenado retornar a condição de cidadania ativa, mas também interessa a própria segurança pública[7].
Ao fim, devemos ressaltar que inúmeros são os problemas na fase executória, então a aplicação de medidas alternativas que ajudem a amenizar tal situação é indispensável à segurança da sociedade e dos próprios presídios.
É certo também que no postulado básico de justiça esta contida a ótica do razoável e do bom senso, logo, o combate as Organizações Criminosas é um dever Estatal e uma conquista social.

5. Referências Bibliográficas.

Bitencourt, Cezar Roberto. A Falência da Pena de Prisão: Causas e alternativas. 3ª Ed. Saraiva. São Paulo. 2004.

Gomes, Luiz Flávio. Penas e medidas alternativas a prisão. 1.ed.,2.tir. São Paulo: RT, 1999. p.30. Apud FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir, trad, Ligia Vassallo, 2 ed., Petrópolis: Vozes, 1983.

Oliveira, Edmundo. Política criminal e alternativas à prisão. Rio de Janeiro: Forense, 2001.


Rodrigues, Anabela Miranda. Novo olhar sobre a questão penitenciaria. São Paulo: RT, 2001.

SHECAIRA, Sérgio Salomão; CORRÊA JUNIOR, Alceu. Teoria da pena. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
SILVA, Carlos Alberto Fanchioni. O liminar do século XXI no sistema penitenciário: justa opção entre o combate a criminalidade das organizações criminosas ou ensaio na aplicação dos direitos aos encarcerados. Disponível na Internet: http://www.ibccrim.org.br/, 12.08.2002
[1] Gomes, Luiz Flávio. Penas e medidas alternativas a prisão. 1.ed.,2.tir. São Paulo: RT, 1999. p.30. Apud FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir, trad, Ligia Vassallo, 2 ed., Petrópolis: Vozes, 1983. p.234 e ss.
[2] Oliveira, Edmundo. Política criminal e alternativas à prisão. Rio de Janeiro: Forense, 2001.p. 10.
[3] Rodrigues, Anabela Miranda. Novo olhar sobre a questão penitenciaria. São Paulo: RT, 2001. p.30.
[4] BITENCOURT, Cezar Roberto. A Falência da Pena de Prisão: Causas e alternativas. 3ª Ed. Saraiva. São Paulo. 2004. p. 153/209.
[5] SILVA, Carlos Alberto Fanchioni. O liminar do século XXI no sistema penitenciário: justa opção entre o combate a criminalidade das organizações criminosas ou ensaio na aplicação dos direitos aos encarcerados. Disponível na Internet: http://www.ibccrim.org.br/, 12.08.2002.
[6] OLIVEIRA, Edmundo. Política criminal e alternativas à prisão. Rio de Janeiro: Forense, 2001.p. 7.
[7] SHECAIRA, Sérgio Salomão; CORRÊA JUNIOR, Alceu. Teoria da pena. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.p.29.

A VIOLÊNCIA E A SEGURANÇA PÚBLICA


RAFAEL DAMACENO DE ASSIS
Acadêmico de Direito, ex-estagiário do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná e Vara de Execuções Penais da Comarca de Londrina.
ISABELLA ZUBA DE OLIVA
Acadêmica de Direito e Estagiária da Justiça Federal da 4ª Região.

SUMÁRIO: 1. Violência x Segurança 2. Individualismo e Agressividade 3. Definitivamente uma sociedade violenta.


1. Violência x Segurança.

Não é apenas nas relações internacionais que se manifesta a tendência violenta, agressiva e bélica da civilização contemporânea, embora seja nessas que a violência atinge maior expressividade e magnitude. Nos armamentos militares se concentra o grande potencial de destruição da humanidade. Cada Estado, por seu lado desenvolve formas cada vez mais arbitrarias e violentas de resguardar a paz interna em seus territórios. Notadamente nos países “em desenvolvimento”, sempre mais vulneráveis e instáveis politicamente, a violência se transforma em recurso cotidianamente utilizado.
Em nome da autodefesa e dos interesses do cidadão comum, os mecanismo de controle tornam-se cada vez mais potentes e ostensivos. Multiplicam-se os efeitos militares e da policia-civil, tentando detectar núcleos de ação revolucionaria e criminal, conter atitudes consideradas suspeitas e desencadear formas de repressão agressiva. E, como as atitudes consideradas suspeitas ou ameaçadoras para o cidadão comum são variadas e ambíguas, desencadeia-se uma postura agressiva contra a população em geral. Essas posturas associam ameaça, criminalidade e comportamento desviante com toda sorte de preconceito racial, ético, religioso, xenofóbicos, sexual e de geração e, essencialmente, as sócia-se cada vez mais a criminalidade com a pobreza.
E, uma vez que o Estado passa por um período de redimensionamento de suas funções sociais, em que, em nome da redução do déficit publico (como exigem os acordos internacionais), vem cortando recursos destinados a setores essenciais, como educação e segurança, multiplica-se as empresa de segurança privada. Casa, empresas bancos, condomínios são vigiados por segurança particular recrutados indiscriminadamente entre a população em geral e de baixa renda. Sem treino especial, sem qualquer tipo de consciência critica a respeito da função que desempenha, crescem dia a dia os grupos de jagunços do capitalismo agrário, adotarem uma atitude agressiva e serem responsáveis por violências arbitrarias contra a população. Praticas cotidianas de vistoria, solicitação de identidade e fiscalização são levadas a cabo por essas milícias para oficiais no acesso a empresa e condomínios. É a privatização da violência e da arbitrariedade contra o cidadão comum.
Por outro lado, o crescimento de praticas econômicas clandestinas, como imensa infra-estrutura que torna possível o trafico internacional de drogas e contrabando de produtos estrangeiros, levou a formação de um aparato militar clandestino que atua impunemente contra a sociedade. Gangues controlam regiões inteiras de comercio de drogas e uma infindável rede de traficantes e usuários, promovendo roubos, assaltos e assassinatos.
A perda de eficiência e a diminuição das funções sociais das instituições governamentais, o anonimato das cidades e a impunidade legal fazem aumentar essas diversas formas de violência que criam um estado de guerra civil, nos qual é impossível identificar com precisão as hostes inimigas, tal a proliferação de facções e milícias. O que se pode perceber com nitidez é que, para alem da violência entre nações, cresce a violência no interior de cada país, em especial nos países pobres, em que a instabilidade, a descrença nos poderes públicos e a sensação de abandono e insegurança são mais acentuadas.
Recentemente pesquisas realizadas na cidade de São Paulo revelaram que a população das favelas teme mais a policia do que as quadrilhas de narcotráfico. Essas posturas refletem o despreparo dos meios oficiais de segurança, a corrupção dos policiais e uma sistemática historia de violência contra a população.
Demonstrativos também desse estado de guerra civil e de desconfiança por parte da sociedade, cada vez mais cercada, são as chacinas que se sucedem entre os miseráveis das grandes cidades, promovidas ora pela policia civil, ora por gangues ligadas ao narcotráfico. Os números são assustadores. Vinganças, tiroteios, disputas, roubos e assassinatos tornam os dias das periferias das metrópoles contemporâneas cada vez mais sangrentas.

2. Individualismo e Agressividade

Além dessas formas de violências já mencionadas e que são praticadas oficial e oficiosamente por algum tipo de organização (e com objetivo mais ou menos definidos), assistimos de formas generalizadas a um recrudescimento de relações agressivas entre as pessoas em geral. E, nas medidas em que a esfera da vida privada tende a ser invadidas pelos meios de comunicação de massa, as agressões interpessoais se tornam conhecidas e são divulgadas em chamadas manchetes de jornal.
A violência passa a ser cada vez mais um recurso, e quase nunca o ultimo. Esse comportamento é incentivo pelo individualismo da sociedade contemporânea, que analisa cada questão como resultante de necessidade e anseios absolutamente pessoais e únicos. Antigas formas de solidariedade perdem sua força, enquanto as mais antigas instituições sofrem duros golpes em sua credibilidade e legitimidade. Tudo favorece o comportamento individualista que se manifesta, por sua vez, não só na produção, mas também no desenvolvimento de estratégicas de autodefesa ou de procurar “fazer justiças pelas próprias mãos”.
Outra bandeira que vem induzir a ação violenta é o constante apelo ideológico ao desenvolvimento da personalidade competitiva e ambiciosa, como elemento necessário à realização individual. Concorrência desenfreada, rivalidade e a idéia da legitimidade das leis de mercado permeiam as campanhas publicitárias e as avaliações econômicas, táticas de defesa pessoal e jogos de guerra são simulados em treinamento nas grandes empresas, estimulando os funcionários a desenvolver espírito competitivo, ambições e agressividade.
Não e preciso mencionar de que maneira a cultura de massa, por seu lado, estimula posturas agressivas ao criar os mitos da comunicação (os super-homens, as superquadrilhas e os superassassinatos).

3. Definitivamente uma sociedade violenta.

Hoje lembramos com nostalgia dos anos 60, quando aquilo que opunha os cidadãos de uma cidade ou de um país eram questões ideológicas e políticas, diferentes ideais que se divisavam o horizonte da vida social.
Assistimos agora a um panorama de mudanças institucionais avassaladoras, em que instituições consideradas inabalável parecem atravessar irreversível debilidade. Emerge uma sociedade complexa e diferenciada, na qual diversos grupos minoritários (éticos, políticos, regionais) buscam seu espaço social. Percebemos também a agonia da cultura clássica européia, cujas primeiras evidencias se manifestam nos anos 50 na crise do pós-guerra. Valores como trabalho, que guiavam a vida dos homens em sociedade e constituíam sua identidade, são rapidamente substituídos por seus opostos.
Nesse clima de começo de milênio, a violência se desenvolve e se generaliza. Escandaliza, choca, torna-se cada vez mais banalizada, mas parece também, como outros aspectos da vida social, fugir ao controle dos homens e das instituições. E, assim como a pobreza, a violência indiscriminada, a impunidade dos criminosos e a diversidade dos grupos em conflitos, põem em xeque a mais otimista analise sobre a sociedade contemporânea. Colaboram também para intensificar os paradoxos da sociedade atual, fazendo com que tendências aparentemente opostas se contraponham de forma crescente: a pobreza e a abundancia, o individualismo e a massificação, a democracia e o autoritarismo.